A estreia de O Dentista Mascarado foi cercada de expectativas. Antes de entrar no ar na última sexta-feira 05, o novo produto da Rede Globo deu muito o que falar e por uma série de motivos. Primeiro, por se tratar de uma produção que traz a forte assinatura de Fernanda Young e Alexandre Machado, responsáveis por Os Normais, obra icônica no humor brasileiro, mas que não vem conseguindo engatar algo que dure mais que uma temporada. Além disso, tratava-se da estreia do talentoso humorista Marcelo Adnet, tido como a maior joia do humor televisivo atual.
Ao analisar uma estreia dessa é preciso pensar por vários ângulos. A expectativa em torno do primeiro trabalho de Adnet pós-MTV era tão grande que, independente do que ele fizesse, haveriam os críticos de plantão, viúvos do excelente trabalho anterior, isso seria inevitável. Além disso, o texto do casal também vem sendo questionado desde o fim de Os Normais, graças ao esmagador sucesso da época, por conta disso, muita gente parece sempre esperar algo que supere a trama de Rui e Vani.
Tentando deixar esse tipo de análise para quem gosta de viver de passado, e olhando exclusivamente sob o ponto de vista do episódio inicial, O Dentista Mascarado mostrou-se um acerto sem precedentes. Difícil apresentar um único equívoco dessa produção, embora com um episódio seja difícil dizer de forma contundente que trata-se de um show longevo, o potencial mostrado não pode ser ignorado e as fichas podem ser apostados numa obra de qualidade.
O texto mostrou-se inteligente e mostrou a marca principal do casal de autores: as piadas de duplo sentido, escrachadas, mas que passam longe de serem sensacionalistas ou vulgares, e ainda conseguem produzir críticas que levam o telespectador a refletir. A aposta em mostrar piadas sem graça, exatamente assim, como piadas sem graça também funcionou perfeitamente e mostrou o tom crítico e ácido do show - além de mostrar também que uma pessoa comum adora contar piadas de efeitos que quase nunca funcionam. Quem não entendeu esta intenção e levou a sério essas piadas, infelizmente não teve a percepção da intencionalidade do roteiro.
O roteiro também acertou ao criar diálogos rápidos e que mudavam de assunto numa velocidade assustadora. O público mais distraído ficaria boiando em questão de segundos com a agilidade na mudança de rumos dos assuntos tratados nos diálogos. E todas as situações e diálogos somente funcionaram porque a direção foi cuidadosa, atenta e perceptiva. Ao receber um roteiro que se aproximava das histórias em quadrinhos - ou dos desenhos animados - o diretor José Alvarenga Júnior mostrou sua vasta competência ao criar um universo que captou todos estes elementos sem parecer tosco ou pobre.
Em meio a tantos destaques positivos seria impossível ignorar o elenco. E que elenco. Leandro Hassum conseguiu se afastar de tudo o que fez até o momento na TV e pintou um personagem interessante e soube servir de apoio para a estrela da noite. Enquanto isso, Taís Araújo simplesmente arrasou nesta estreia. A atriz que ficou muito marcada pelo incrível trabalho em Cheias de Charme, quando deu vida a Penha, soube se despir dessa personagem e construir uma nova cheia de detalhes e completamente diferente. Mesmo repetindo uma personagem fincada na comédia, Taís não errou e foi minuciosa em sua composição. Destaque ainda para a ótima presença de Otávio Augusto e Diogo Vilela que apareceram pouco, mas sempre com qualidade.
Mesmo assim, a estrela da noite foi mesmo Marcelo Adnet. Se ele era tido como uma joia do humorismo brasileiro, após esta estreia ele se mostrou uma joia raia na teledramaturgia nacional. Muito mais que um humorista competente, ele se mostrou um grande ator capaz de compôr um protagonista dificílimo e criar uma riqueza rara para esta composição. Adnet fincou os dois pés na animação com referências aos quadrinhos e não se encostou no texto, ao contrário, contribuiu muito e enriqueceu o roteiro. Detalhista ao extremo, criando um tom de voz completamente hilário, uma risada incrível e trejeitos sensacionais, Adnet mostrou nesta estreia que acertou ao deixar a MTV pela Globo. Muito mais que visibilidade ele é capaz de mostrar uma veia que, aparentemente, era ignorada: a de ator. E vai longe.
O Dentista Mascarado estreou com um potencial raro de se ver. Num ano cheio de acertos da Rede Globo até o momento - Pé na Cova e A Grande Família são só dois exemplos - a produção tem força para ser a melhor coisa do ano, potencial há, mas é preciso aguardar os próximos episódios.