Nesta semana, só para variar um pouco, voltou à tona a discussão que parece ser eterna. "O que é mais importante numa avaliação? A qualidade ou a audiência alcançada?" Muitos defendem que audiência é sinônimo de qualidade e vice-versa. Um dos principais argumentos para esta máxima é partir do princípio que todo produto é criado para o público e se o atinge, há sinais de qualidade.
Na outra ponta do iceberg estão a maioria dos críticos especializados. Para eles, a qualidade quase nunca deve ser medida pela audiência, afinal, obter bons números na disputa pelo gosto do telespectador passa por uma série de variáveis que não só o zelo por uma produção. Os críticos argumentam também que, num país como o Brasil, nem sempre o público tem condições de julgar uma produção, pois assiste de forma passiva.
Ambos têm razão. Verdade seja dita que uma obra de teledramaturgia é feita para agradar o telespectador e não a crítica especializada - minoria entre os que assistem a uma novela. Portanto, quando esta obra consegue cair no gosto popular, ela atingiu parte de seu objetivo. Parte, que fique claro. E também é verdade que num país como o Brasil o público não tem condições de julgar a qualidade de produção. Veja, uma obra como Capitu não obteve os melhores números de audiência, mas foi uma obra-prima sob o ponto de vista técnico e de roteiro, até porque se tratava de livre inspiração de uma das maiores obras da Literatura mundial, Dom Casmurro (Machado de Assis).
Poucos sabem disso, mas a televisão no Brasil tem duas três funções primordiais que se interagem entre si. Informar, entreter e formar. A teledramaturgia é vista sempre como obra de entretenimento, uma inverdade, pois ela deve conseguir atingir as três vértices de objetivos da TV, se não consegue, é porque não foi uma produção de qualidade.
A discussão nesta semana se iniciou por conta de Morde e Assopra e a seqüência em que as personagens da trama descobrem sobre a Naomi robô (Flávia Alessandra). Esta sequência atingiu picos altos de audiência, mas também foi duramente criticada por especialistas, como toda a novela vem sendo. A trama de Walcyr Carrasco consegue números incríveis de audiência e, de fato, caiu no gosto popular, porém, ela serve exatamente para que? Nada. É puro entretenimento vazio e que não leva o telespectador em nenhum momento a refletir sobre o que está assistindo. Pode-se julgar uma obra assim como um produto de qualidade? Uma produção que investe na falta de conhecimento e instrução do brasileiro para torná-lo refém de audiência não pode ser bem avaliada, de fato.
Mas há o outro lado da moeda. Uma trama com qualidade, mas que não consegue interagir com o telespectador também dá sinais de ser problemática. Foi o que aconteceu na maior parte do tempo, por exemplo, com Tempos Modernos. Uma das melhores propostas para a inovação da teledramaturgia nacional nos últimos anos e que acabou por não acontecer simplesmente porque obteve números pífios na audiência. Bosco Brasil propôs inovar não apenas na história, muito diferente de tudo que havia se visto, mas propôs inovar o formato e a linguagem da novela, tirando do conhecido folhetim. O público não entendia boa parte das situações, não conseguia acompanhar o raciocínio poético da história e rejeitou a novela, fadada ao fracasso.
Tanto Morde e Assopra quanto Tempos Modernos foram problemas para a teledramaturgia nacional. Se a primeira obteve resultado imediato, não conseguiu contribuir em nada para a TV e muito menos para os telespectadores, a segunda tentou contribuir bastante, mas não conseguiu atingir seu principal público, produzindo ruídos de comunicação.
A bem da verdade, o ideal é que uma produção consiga unir Qualidade e Audiência, o que é muito raro no Brasil. O caso mais recente é Cordel Encantado, aclamado por crítica e público. Mas produções assim não se vêem todos os dias.