Um dos principais equívocos dos críticos ao escrever sobre teledramaturgia é individualizar a análise e, por conta disso, diminuir o tamanho da discussão que poderia ser bem mais amplo. É evidente que leva algum tempo para se notar e caracterizar mudança comportamental do telespectador. Tratado como simples agente passivo no processo industrializado que é a telenovela, o público vem mostrando que não é bem assim, pois cabe a ele determinar o sucesso ou fracasso de determinado produto.
Tratada até o momento como uma das obras mais cults dos últimos anos no horário das 18 Horas, Lado a Lado também é inegavelmente o principal fracasso histórico do horário. É difícil enxergar alguém que consiga encontrar pontos negativos no folhetim que preza pela qualidade textual, pelos bons diálogos, boa direção e elenco acertado. O que, numa análise mais simplista, torna-se praticamente inviável justificar o fracasso.
E aí começa-se a especulação menos inteligente. Ao dizer pura e simplesmente frases como "a novela é inteligente demais para o público brasileiro" é ignorar diversos elementos que precisam ser levados em conta - não significa também que a frase seja errônea, mas simplista. Talvez, confortavelmente de seu sofá, o crítico pode se dar ao luxo de dizer isso, mas a falta de reflexão sobre isso é prejudicial na discussão.
Lado a Lado não tem um problema que a marque como fracasso. Ela aponta um problema da teledramaturgia atual que já vinha se delineando e, com esta obra, fica ainda mais claro. Grandes sucessos do início do milênio como Sinhá Moça e Cabocla e também em outros horários como Laços de Família e Páginas da Vida ou até sucessos do milênio passado como O Rei do Gado certamente estariam fadadas ao fracasso fossem exibidas originalmente nestes últimos tempos.
A afirmação acima pode parecer equivocada, pois trata algumas obras que se tornaram clássicas na memória afetiva do telespectador, mas é a síntese do problema que acomete a teledramaturgia e ninguém parece se aperceber. O público das telenovelas mudou. A geração que assiste folhetins não é a mesma dos anos 90 e início deste milênio. Talvez as pessoas sejam, mas a modernidade as mudou de tal forma que não há mais retorno.
Fracassos de novelas como A Vida da Gente, Araguaia - mesmo Viver a Vida com todos os seus equívocos - e agora Lado a Lado dão o alerta para isso. O público não se importa se o texto é uma obra prima. O telespectador não está interessado em diálogos cheios de referências e que prezam exclusivamente pelo alto teor intelectual. Quem vê telenovela não dá importância maior a uma direção cinematográfica. Um elenco de qualidade recheados de bons nomes também não é garantia de sucesso. Se a trama é arrastada, tem ritmo próprio, ela recebe o carimbo do fracasso.
Parece claro, com Lado a Lado, que novelas lentas, que desenvolvem sua história de forma calma, quase bucólica, não estão, mas já perderam completamente espaço na TV brasileira. A bem da verdade é que a Rede Globo ainda não se deu conta disso, mas o telespectador já deu seu veredito e não aceita mais este tipo de postura. O público - acostumado a receber informações em tempo real nos idos da internet - não aceita mais uma história tranquila que se arrasta por meses e meses primando mais pelo diálogo do que pelos ganchos.
A constatação é triste, pois uma novela lenta não é necessariamente ruim, ao contrário, e a atual novela das 18 Horas é a prova do momento. Um dos textos mais corretos dos últimos anos no horário, certamente o melhor elenco reunido para o horário em tempos, mas nada disso é suficiente para chamar a atenção do público, simplesmente porque o ritmo da história é de fazenda e o telespectador brasileiro quer, para a TV, um ritmo de metrópole.
Os grandes sucessos das telenovelas brasileiras nos últimos anos foram exatamente assim. Cordel Encantado ficou marcada pelas suas viradas e ganchos que chamavam o telespectador diariamente para acompanhar sua história. Cheias de Charme provocou burburinho no público justamente por conta de seus muitos acontecimentos inovadores. Avenida Brasil se transformou num sucesso retumbante de audiência e repercussão graças ao ritmo alucinante empregado pelo autor.
É impossível tanto aos autores, quanto aos diretores, à cúpula de dramaturgia das emissoras e também aos críticos ignorar este fenômeno. Acabou o espaço para novelas lentam. O público quer agilidade. O público tem pressa. A situação de Lado a Lado grita aos ouvidos de todos os envolvidos: não adianta insistir, o telespectador quer conhecer toda a história em um capítulo. É preciso contar uma história por dia, se as novelas não quiserem fracassar.