quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Salve Jorge tem boa receita, mas ingrediente estragado

Quando se é profissional de qualquer área sabe-se que é preciso evitar os vícios. A maturidade profissional somente chega conforme vamos trabalhando. É o tempo que provoca isso, porém, ele também traz uma série de vícios e atalhos que quase sempre precisam ser enxergados antes de se produzir novamente, a fim de que o novo trabalho não saia prejudicado.

Criar receitas e modelos pode ser uma boa saída para evitar fracassos, principalmente num universo como o da TV brasileira em que o telespectador ainda é tão tradicional. Porém, é preciso saber o momento exato de inserir cada um dos ingredientes dessa receita, caso contrário, o prato que outrora foi muito elogiado, pode acabar sendo alvo de críticas justas simplesmente porque um ingrediente foi colocado no momento equivocado.

Foi o que se viu na atual novela das 21 Horas, um ingrediente estragado. Fato é que, por si só, o que foi ao ar até agora mostra que Salve Jorge não é uma novela ruim, longe disso. Glória Perez parece ter pesquisado bastante todos os temas antes de decidir colocá-los como núcleos de sua obra, pois todas as histórias são bem completas e redondas.

Enquanto o amor inocente e excessivamente meloso do casal de protagonistas faz fãs e haters pelo Brasil, enquanto a história dos policiais em trabalho de pacificação da favela, enquanto a história da própria favela, enquanto o núcleo um tanto quanto cômico da família que disputa uma herança, enquanto todas estas histórias tem momentos agradáveis e interessantes, rouba a cena o núcleo forte e muito bem desenvolvido do tráfico de mulheres.

Este é, sem dúvida, o maior acerto da autora neste roteiro - e um dos melhores que ela já desenvolveu ao longo dos anos. A força dessa história faz com que tudo gire em torno dela. Ainda que seja um núcleo que ainda não se aproximou dos protagonistas - mas sabe-se que vai - acabou roubando a cena por ser muito mais forte, denso e interessante, do ponto de vista artístico.

Por outro lado, Glória Perez é o melhor exemplo de criadora de receitas. Desde que entrou para o time de autores das 21 Horas ela mantém um formato em seus roteiros. Sempre fazendo um paralelo entre o Brasil e um país com cultura completamente diferente, ela conseguiu atrair a atenção do telespectador com isso e formar sua marca para fazer novelas. E sempre funcionou porque sempre foi bem amarrado com o roteiro. Até agora.

Em O Clone a protagonista Jade (Giovana Antonelli) era muçulmana, ou seja, mostrar a cultura daquele povo era parte primordial do roteiro. Em América, o sonho de Sol (Débora Secco) era o de muitos brasileiros da época, deixar o Brasil e construir uma vida no exterior com oportunidades melhores. Ou seja, a história da protagonista era entrar na América e mostrar a cultura, os percalços e caminhos fazia todo sentido. Em Caminho das Índias Maya (Juliana Paes) era indiana, portanto, tal qual na primeira novela, era necessário mostrar a cultura da Índia.

E Istambul serve para que em Salve Jorge? A protagonista Morena (Nanda Costa) foi inserida no núcleo da favela, o protagonista Théo (Rodrigo Lombardi) é policial, também brasileiro. Não há a menor necessidade de se mostrar a cultura do povo de Isambul na novela. Você pode justificar que a boate de Lívia (Cláudia Raia) com as mulheres traficadas irá se alojar, como já está ocorrendo, naquele local, mas e daí? Nas 04 primeiras semanas da novela, a boate foi em Madrid, nem por isso houve necessidade de se inserir personagens espanhóis e mostrar as tradições daquele país.

Ainda que, em algum momento, as personagens que residem em Istambul acabem se interligando de alguma forma com a protagonista - o que parece improvável - não há razão de existir este núcleo. Bastava inserir as personagens no momento em que eles fossem fundamentais para fazer a história caminhar. Até o momento, o local funciona como um núcleo solto, uma espécie de merchan turístico que não tem nenhuma ligação com o restante da novela.

Glória Perez criou uma receita e seus bolos sempre deram bons resultados. Ela foi tentando manter a fórmula a cada novo trabalho e, ao menos a tentativa de inserir uma nova cultura para o telespectador brasileiro, funcionava e, sempre em algum momento, essa nova cultura virava febre. 

Em Salve Jorge a receita foi mantida, mas, ao deixar personagens secundários e sem nenhum vínculo com o núcleo principal, a história de uma nova cultura não faz o menor sentido. Soa desinteressante ouvir os bordões, ver as danças e conhecer a história de Istambul. Dessa vez, o ingrediente estava estragado e vem prejudicando toda a receita. 

domingo, 11 de novembro de 2012

Teleton funciona como entretenimento e traz reflexões

Após mais de 27 horas no ar chegou ao fim pouco antes da uma da manhã deste domingo a 16ª edição - e a comemoração de 15 anos - de uma das maiores maratonas televisivas do Brasil. Organizado pelo SBT, através de seu dono Sílvio Santos, o Teleton vem há 15 anos realizando edições com artistas de todas as emissoras no objetivo de arrecadar doações para contribuir para a AACD.

A despeito da minha opinião sobre a intencionalidade do evento - você pode ler aqui texto escrito neste espaço em 2010 - é fato que o Teleton movimenta o país todos os anos e consegue reunir uma gama gigante de personalidades da TV, sejam artistas, atores, apresentadores ou músicos. É, talvez, o programa com maior capacidade para reunir profissionais de diferentes áreas e emissoras da televisão brasileira.

Nos últimos anos, além dos equívocos que o outro texto apontou, o programa também se equivocava enquanto show. Cansativo e monótono o público perdia o interesse ao longo das horas porque não havia nada demais, eram apenas artistas entrando e saindo do palco relembrando os telefones e pedindo doação, não havia nada de entretenimento e que chamasse a atenção do telespectador.

Em 2012 foi diferente. Embora a direção do programa ainda não tenha compreendido a necessidade de olhar para trás, para os primórdios quando o Teleton promovia jogos, eventos gravados e que chamavam muito mais a atenção do público. É preciso reconhecer que houve um avanço gigante em relação aos anos anteriores. Com maior liberdade, os apresentadores puderam demonstrar carisma, personalidade e promoverem brincadeiras, transformando o evento num show de entretenimento.

Entretenimento de qualidade num sábado é raro na TV aberta brasileira e por isso é preciso elogiar o evento. Mesmo sendo esporádico, é possível observar que o público mostrou interesse no que foi ao ar. É impensável dizer que a audiência conquistada ao longo do sábado foi por conta do desejo do brasileiro em contribuir, ninguém ficar o tempo todo assistindo algo para fazer doação, se assiste é porque está gostando do que vê.

Diante da constatação que o show de entretenimento promovido pelo evento foi de qualidade - embora o pano de fundo transforme isso num show de horrores - é possível concluir algumas coisas. O ponto alto do evento tem nome: Eliana. A apresentadora que ficou por quase 6 horas comandando as atrações deu um show de empatia e carisma e foi, disparada, o que teve de melhor nesse dia. Parece claro que Eliana se transforma quando está ao vivo e precisa urgentemente que seu programa deixe de ser gravado, pois isso daria muito mais liberdade a esta ótima apresentadora.

Outra conclusão é a de que o SBT precisa mudar sua grade de sábado. Acostumada a perder religiosamente para a Rede Record na audiência deste dia, é evidente que o sábado é o calcanhar de aquiles da emissora. Mas o Teleton mostrou o que o público quer ver neste dia. E a emissora tem a faca e o queijo na mão. A faca é a constatação de que é possível promover um programa de entretenimento jovial e o queijo é quem deve comandar: Patrícia Abravanel.

A filha de Sílvio Santos deu show nos momentos em que foi ao palco e demonstrou tamanha naturalidade diante das câmeras que se torna impensável desperdiçar um talento assim. A apresentadora tem domínio de palco, sabe animar a platéia e conhece os atalhos para fazer uma boa entrevista. A naturalidade com que ela fala tudo que pensa é um charme a parte.

Se o Teleton não tem as melhores intenções, enquanto show de entretenimento ele funcionou como há muito não ocorria e, muito mais do que isso, serviu para que a cúpula do SBT possa fazer algumas observações importantes e melhorar ainda mais a grade na disputa pela audiência.

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