A primeira fase de O Rei do Gado é, indiscutivelmente, um dos momentos mais bonitos da teledramaturgia nacional. O brilhante texto de Benedito Ruy Barbosa, aliada à direção de Luiz Fernando Carvalho, a fotografia de Walter Carvalho e o elenco impecável, criaram cenas inesquecíveis que ficarão para sempre no imaginário de quem assistiu. Mas essa primeira frase acabou e é aí que a novela realmente começa.
Assistindo a reprise pelo Canal Viva, vemos uma imensa diferença entre as fases. Não em termos técnicos ou de interpretação, mas em termos de texto. Que o ritmo narrativo de Benedito Ruy Barbosa é lento, todos sabemos. O estilo do autor é esse, tem muitos admiradores e deve ser respeitado, mas o grande problema de O Rei do Gado, é que a trama fica girando sem sair do lugar.
O romance entre Bruno Mezenga (Antônio Fagundes) e a bóia-fria Luana (Patrícia Pillar), apesar de interessante, não segura a novela. Até porque não existem grandes empecilhos para o amor dos protagonistas. Tudo fica muito filosófico e abstrato. Os conflitos dos filhos de Mezenga, Marcos (Fábio Assunção) e Lia (Lavínia Vlasak) também não chamam atenção, já que os personagens não tem, pelo menos em um primeiro momento, empatia com o público.
A grande promessa de trama é a misteriosa Marieta (Glória Pires) que chega na fazenda do tio de Bruno, o solitário Jeremias Berdinazzi (Raul Cortez), dizendo ser sua sobrinha desaparecida e portanto, herdeira. Mais tarde, vamos descobrir que a herdeira é Luana e que Marieta, na verdade Rafaela, é uma impostora. Infelizmente, essa é uma trama que não vinga. Mesmo com o show de interpretação de Raul Cortez, Benedito Ruy Barbosa não conseguiu contar esse entrecho de forma envolvente, jogando fora o principal trunfo da novela.
Nesse jogo de histórias que não decolam, a única que realmente começa a criar interesse, é a de Léa (Silvia Pfeifer), mulher de Bruno. Cansada de ser ignorada pelo marido, Léa se envolve com o cafajeste Ralph (Oscar Magrini), abandona o rei do gado e se casa com o amante, buscando a felicidade. O problema é que Ralph só está interessado nos bois de Léa, e quando ela sai do casamento com quase nada, o “amor” do rapaz desaparece. Léa passa a conviver com a violência de Ralph que chega a agredi-la e com suas amantes, Suzane (Leila Lopes) e Marita (Luciana Vendramini).
A trama de Léa se torna tão importante, que é a partir dela que, da metade pra frente, O Rei do Gado passa a girar. O assassinato de Ralph se torna o centro da novela. Bruno, Léa, Marcos, Marita, Suzane e seu marido, Orestes (Luiz Parreiras) são suspeitos. Daí pra frente, a novela se torna uma grande história policial, conseguindo ótima audiência e todos, emissora e público, terminam felizes para sempre.
Do jeito que eu coloco a coisa, pode parecer que acho O Rei do Gado uma novela ruim. Não acho. É uma história até interessante, mas que poderia ser infinitamente melhor. Rafaela, que deveria ser uma grande vilã, movimentando as tramas, acaba relegada à fazenda, sem muito acrescentar à novela. Seria interessante um embate com Luana, tanto pela herança como pelo próprio amor de Bruno. Enfim, coisas que poderiam ter sido e não aconteceram.
O Rei do Gado é um novelão com cara de clássico, tem seus atrativos e acertos, mas já começava a mostrar características do que se transformaria a Teledramaturgia nas décadas seguintes: um emaranhado de ótimas histórias que não são contadas.
Por Walter de Azevedo
7 Quebraram tudo:
Bem legal seu texto Walter!
Também sou apaixonado pela primeira fase da novela. A impressão que tive é que eu estava vendo cinema pela primeira vez em uma novela. Aliás, sempre cito a primeira fase de O Rei do Gado como o melhor trabalho do Benedito na TV, se bem que a direção tem um mérito enorme ali.
Depoiis, confesso que deixei a novela de lado. Nao tenho paciência com o Benedito.
E concordo, Walter, é um novelão, clássico. Apesar de eu ter visto pouco, reconheço que a novela tem grandes méritos. Parabéns pelo ótimo texto!
Gostei bastante da análise.
Você foi muito coerente, Walter. Concordo contigo. O Rei do Gado é uma novela agradável de se assistir, muito bem escrita, mas essa segunda fase está morníssima.
Essa novela tem uma das trilhas sonoras mais lindas que já existiu. E ainda tenho o cd lançado na época de sua exibição inédita.
Uma pena eu não ter esse Canal Viva.
Concordo em absoluto, Walter! Apesar de toda beleza e poesia da novela, O Rei do Gado é uma novela cujos grandes acontecimentos se restringiram a primeira fase. No texto não foi mencionado, mas a segunda fase ainda conta com o desaparecimento de Bruno, que torna a trama ainda mais cansativa. O mérito maior desta segunda fase se resumiu aos personagens secundários: a já citada Léa, o sem-terra vivido por Jackson Antunes, e o Senador Caxias em seu envolvimento com a luta dos sem-terra e no imbróglio amoroso com a empregada.
Uma observação: Rafaela, ao final, é revelada como sobrinha de Berdinazzi também. Ela não era filha do irmão dele que morreu na guerra (Marcelo Anthony)?
Concordo. Assisti "O Rei do Gado" em sua exibição original e na reprise do VAPVDN. Como na primeira vez eu tinha 7 anos, e na segunda, acho, 9, a análise ficou comprometida. Mas é verdade que o estilo de Benedito é marcado por tal lentidão que, muitas vezes, prejudica a boa contagem da história.
Um dos motivos que me fez acompanhar a trama foi a volta de Glória Pires às novelas depois de 3 anos. Acredito que todos esperavam por uma boa personagem que seria a real antagonista da história. Mesmo com as paralelas conduzindo a história, como bem analisou o Walter, a novela nunca deixou de ter um ritmo lento e talvez a maior marca disso seja as incontáveis andanças de Luana pelos canaviais. Mesmo assim, gosto da novela.
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