terça-feira, 8 de maio de 2012

A Teledramaturgia em estado de graça

O Brasil é, sem sombra de dúvidas, o país das telenovelas. A Rede Globo, principal emissora do país, desenvolveu uma capacidade apurada na produção dos folhetins e se transformou na maior produtora do Planeta, em termos de qualidade. Mas é preciso reconhecer que, por conta da audiência, a emissora foi muito mais pragmática do que criativa nas escolhas de suas obras nos últimos 10, 15 anos.

Com a crescente concorrência por audiência, já que as emissoras menores do Brasil passaram a investir mais em qualidade de sua grade de programação, a Globo sentiu que não podia errar e, por conta disso, começou a inovar cada vez menos e deixar toda sua programação estática, transformando as novelas em obras de grande qualidade, mas sem nenhuma ousadia.

Nos últimos anos, a direção geral tem tentado retomar o que historicamente faz parte do DNA da programação de telenovelas da casa, a criatividade. Escolhas como Bang Bang e Tempos Modernos, formatos completamente diferentes do que se via nas telenovelas da época, foram feitas, mas o fracasso na audiência causou temeridade e adiou novos investimentos em obras menos pé no chão e muito mais criativas.

O sucesso de Cordel Encantado, entretanto, permitiu que os poderosos da emissora voltassem a sonhar com um tempo em que a criatividade era latente nas telenovelas. O tom farsesco ganhava espaço no folhetim e as histórias de amor, drama e vilanias eram sempre cercadas por um pano de fundo que pouco tinha a ver com o cotidiano - e isso era fascinante.

Cheias de Charme, atual novela das 19 Horas, não poderia estar no ar num momento e horário mais emblemáticos. A trama que lança criatividade em praticamente todas as cenas e que mostra bastante ousadia na construção de sua linha narrativa - ainda que com um pé na realidade - é mais uma prova de que a Globo voltou a aprovar e investir em obras que não seja tão voltadas para o cotidiano. As histórias são as mesmas, óbvio, pois é disso que o povo gosta: amor, ódio, vingança, briga, vilões e mocinhos, mas o pano de fundo, este sim, pode mudar.

E o horário das 19 Horas fazendo sucesso com uma trama cuja personagem mais carismática é absolutamente farsesca, como Chayene (Cláudia Abreu) é, de fato, emblemático. Porque este é o horário em que uma das mais criativas e ousadas obras da teledramaturgia nacional foi ao ar. Mais do que isso, também porque esta obra, para felicidade dos brasileiros, voltou a ser exibida nesta segunda-feira pelo canal Viva.

O retorno de Que Rei Sou Eu para as telas da TV neste momento não poderia ser melhor e mais acertada. A obra de Cassiano Gabus Mendes é um divisor de águas na história das telenovelas e mostra uma ousadia impressionante ao se criar uma história e o modo de como contá-la. Verdade seja dita, a trama era muito mais do que simplesmente inovadora na linguagem ou no pano de fundo, ela era crítica, autêntica, audaciosa e tinha profunda crítica social da estrutura que o Brasil passava.

Mas ter uma novela como Que Rei Sou Eu para que a geração atual de telespectadores veja como é possível se deliciar com uma obra, sem que ela seja óbvia, sem que os locais e as situações sejam próximas de nossas realidades, mas as personagens, essas sim, sejam meras alegorias de nós mesmos, é indispensável nesse momento de reconstrução criativa que as telenovelas brasileiras passam.

Que Rei Sou Eu foi a precursora de obras como Cordel Encantado e Cheias de Charme. Ela é a prova de que é possível fazer um estrondoso sucesso sendo ousado e criativo. Quem não assistiu esta novela, precisa fazer um esforço para acompanhar, pois é das obras mais importantes de que o Brasil teve notícias.

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