segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Fantástico dá aula de bom jornalismo

Qualquer estudante de jornalismo sabe a diferença básica entre informar e explorar. A TV brasileira tem se transformado especialista - de alguns anos para cá - em explorar tragédias. Em minha memória recente lembro que desde o caso Richthofen a mídia tem criado um jeito bastante peculiar de cobrir este tipo de evento que causa comoção no país. Os exageros na cobertura, o emocionalismo barato e a falta de bom senso são marcantes em praticamente todas as emissoras.

Em 2013 isso já aconteceu. O incêndio na boate Kiss, considerado um dos piores da História, foi um prato cheio para os carniceiros da TV. A cobertura midiática foi deprimente e o estilo grotesco de se fazer jornalismo marcou presença. O exemplo mais forte disso se deu durante a exibição de um jornalístico da Rede Record em que o apresentador Geraldo Luís teve a coragem de transformar seu estúdio numa espécie de metáfora da boate, com direito a fumaça e tudo. Ou seja, uma reprodução trash do ocorrido. Isso não é nem nunca foi jornalismo, isso é sensacionalismo na busca pela audiência. 

Obter audiência usando esses métodos, de fato, é fácil. Porém, a função primordial do bom jornalismo nunca foi audiência. Evidente que não adianta fazer bom jornalismo se não há quem escute, quem veja, mas o público é o fim e não o meio. Informar com qualidade, com respeito e sem ultrapassar a linha da exploração é o caminho que leva a uma audiência de nível, capaz de refletir e se posicionar. Este é o jornalismo, o que informa para formar.

Foi esta a aula que o Fantástico deu no último domingo. A premissa da principal reportagem da noite foi a mesma utilizada por Geraldo Luís e sua trupe: reconstituir o que aconteceu na Boate Kiss. O diferencial, contudo, foi o tratamento dispensado. Sem gritos, sem maneirismos e sem sensacionalismo, o jornalístico tratou o tema de forma séria, responsável e mostrando os problemas estruturais do prédio, além de ouvir especialistas e testemunhas. Em suma: uma aula de bom jornalismo.

Este tipo de tragédia suscita o que há de pior no ser humano. A sede por aparecer, por mostrar-se detentor da verdade está inerente aos humanos. O jornalista é, talvez, quem mais tenha voz junto à sociedade e, portanto, essa necessidade acaba se fazendo presente nesses momentos. Mas vai do editorial da empresa seguir uma linha de respeito e privilegiar a informação em detrimento do posicionamento pessoal. Infelizmente, neste caso, a Record não fez isso e essa postura equivocada de seu jornalismo já está tornando uma espécie de marca ali.

Os editores e diretores de jornalismo da emissora deveriam ter assistido o Fantástico na noite de ontem. Talvez assim, aprenderiam como fazer uma reportagem interessante, chamativa e com qualidade, sem precisar descer o nível.

1 Quebraram tudo:

Raylan disse...

Isso faz lembrar um outro caso ocorrido no ano passado. Um carro desceu uma rua em alta velocidade, o motorista perdeu o controle e atravessou a parede de uma casa no fim da rua. O Fantástico e o Domingo Espetacular noticiaram o fato. No Fantástico, foi feita uma demonstração com piloto profissional, em uma pista de corridas, usando uma estrutura para simular a inclinação da rua e determinar a velocidade que o veículo estava no momento do incidente. Já no Domingo Espetacular, usaram uma tábua inclinada e um carrinho de brinquedo - jornalismo de primeira.

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